Instituto Arara Azul enfrenta uma série de denúncias acerca de seu funcionamento irregular dentro do condomínio Busca Vida
Pacientes com obesidade mórbida estão sendo encaminhados pelo plano de saúde Cassi Bahia para uma clínica suspeita de atuar de forma irregular em Camaçari, cidade da região metropolitana de Salvador. Localizada dentro do condomínio residencial Busca Vida, o Instituto Arara Azul é alvo de denúncias por não ter autorização legal para realizar atividades médica ou hospitalar — apenas complementares.
Ainda assim, a clínica continua a internar pacientes em processo de emagrecimento sem cumprir requisitos obrigatórios, relatam usuários sob condição de anonimato. Uma equipe de reportagem procurou a Cassi e o Instituto Arara Azul, e aguarda um posicionamento. Em visita à sede da Cassi na tarde de sexta-feira (1/9/2023), a informação dada pela recepção foi de que a entidade não tem nenhum profissional responsável pelo trato com a imprensa. A funcionária orientou a reportagem a enviar e-mail com os questionamentos, pois a funcionária responsável pelo encaminhamento dos pacientes para o Instituto Arara Azul não falaria pessoalmente.
Entre as irregularidades, a clínica que funciona numa casa residencial descumpre requisitos legais para que possa funcionar como um hospital. Não dispõe, por exemplo, de médicos que atendam em regime de plantão 24h. Atualmente, o serviço de amparo clínico só é feito por médicos em regimes de consultas.
Segundo prevê o Cremeb, hospitais precisam oferecer obrigatoriamente atendimento básico de diagnóstico e tratamento em tempo integral, o que inclui equipe clínica organizada, com prova de admissão e assistência permanente prestada por médicos.
Além disso, o Instituto Arara Azul de Obesidade também não dispõe de uma equipe mínima de profissionais de enfermagem. Uma resolução do Conselho Federal de Enfermagem prevê que unidades médicas que funcionam 24h devem ter a proporção de 33% de enfermeiros (com um mínimo de seis) para pacientes que precisam de cuidado mínimo e intermediário.
Para a modalidade de internação, há a necessidade de 1 profissional de enfermagem para 2,4 pacientes.
Conforme consta no Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde (CNES), o instituto conta apenas com uma enfermeira em seu quadro — ao todo, possui quatro técnicos de enfermagem e doze leitos para pacientes de internação. Embora atenda pessoas adictas e com transtornos mentais, a clínica não dispõe de médico psiquiatra.
Diretor técnico da unidade, David Vazquez diz atuar como cardiologista, embora não apresente RQE (registro de qualificação de especialista) para tal finalidade — ele exerce a função de clínico-geral, em desacordo com a resolução médica. Apesar das supostas irregularidades, o plano de saúde Cassi classifica o Instituto Arara Azul como integrante de sua rede referenciada para tratamento de saúde contra obesidade mórbida, em regime de internamento em clínica especializada.
Uma sede, dois endereços
O Instituto Arara Azul funciona desde março de 2019 em um imóvel destinado à ocupação residencial no condomínio Busca Vida. Em fevereiro deste ano, a clínica já chegou a ser interditada pela Secretaria do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (Sedur) da Prefeitura de Camaçari por atuar sem alvará de funcionamento e da Vigilância Sanitária.
Somente em março, a unidade obteve autorização do Corpo de Bombeiros necessária ao funcionamento de instalações desse tipo. O auto de vistoria expedido pela corporação, contudo, traz endereço divergente do informado no Cadastro Nacional e CNPJ da clínica, registrada na Travessa Busca Vida, s/n, Busca Vida/Abrantes, CEP: 42.825-572.
O endereço do Corpo de Bombeiros, porém, indica outro logradouro: Rua Mico Leão Dourado, s/n, Busca Vida, Lote 04 - Abrantes, CEP: 42.800-970.
Ordem de despejo
Em agosto último, a juíza Íris Cristina Pita Seixas Teixeira, da 2ª Vara de Feitos de Relações de Consumo Cível e Comerciais de Camaçari, concedeu medida liminar (decisão provisória) ordenando o despejo do Instituto Arara Azul por dívida de condomínio.
Por meio de sua assessoria, a direção do Busca Vida informou que o cerne da questão é o funcionamento irregular da clínica, sem autorização do condomínio, cuja atividade comercial não é aprovada, uma vez que só é permitido o uso estritamente residencial.
“Dito isso, informamos que já temos processo judicial em curso contra os proprietários da gleba e também contra o inquilino responsável pela atividade irregular (clínica) na unidade, contrariando as normas condominiais vigentes, apesar das medidas adotadas”, afirma em nota..
De acordo com o texto, o inquilino também é réu em outra ação de despejo movida pelos proprietários do imóvel onde o instituto funciona. O processo tramita na 2ª Vara de Feitos de Relação de Consumo, Cível e Comerciais da Comarca de Camaçari (BA).
A reportagem enviou questionamentos ao plano de saúde, dentre os quais acerca de possíveis medidas para suspensão do convênio com a clínica.
Contatado por telefone, David Vazquez, diretor do instituto, convidou a reportagem para uma visita à clínica, ocasião em que apresentaria documentações sobre a atuação da unidade. A reportagem, no entanto, reforçou um pedido de posicionamento textual. Esta publicação será atualizada tão logo ambos enviem posicionamentos.
Vigilância Sanitária autorizou atividade médica, diz prefeitura
Em nota, a Secretaria de Saúde (Sesau) de Camaçari informou que o Instituto Arara Azul solicitou uma nova adequação de atividades à Vigilância Sanitária municipal. Segundo a pasta, após inspeção no dia 10 de agosto deste mês, a clínica obteve a atualização de suas atividades.
"Desssa forma, atualmente, o instituto possui a Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE 8610-1/01 e encontra-se devidamente autorizado pela Vigilância Sanitária a atuar dentro dessa especificação", diz o comunicado. A especificação, que autoriza a realização de atividades médico-hospitalares, ainda não consta no cadastro até a publicação deste texto.
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