Entrevistas

"A tecnologia trouxe o doutor Google", diz ortopedista sobre automedicação

12 de Março de 2021 às 10h47 - Por: Redação PNotícias (@portalpnoticias) Foto: Divulgação
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Ao PNotícias, especialista alertou para sedentarismo e orientação inadequada em atividades físicas

O ortopedista e traumatologista Luís Felipe Daneu explicou, nesta sexta-feira (12), aos ouvintes do programa PNotícias, da rádio Piatã FM, algumas causas e consequências das dores no corpo causadas pela Covid-19 ou ainda pela realização inadequada de atividades físicas. Em entrevista ao vivo comandada pelo apresentador Jorge Araújo, o médico chamou atenção para o impacto dos recursos tecnológicos nos hábitos físicos da população como sedentarismo e má postura.

O especialista também destacou os cuidados que os pacientes diagnosticados com o novo coronavírus devem tomar com relação a possíveis sequelas da doença nos ossos, músculos e articulações, bem como chamou atenção para o perigo da automedicação não só nessa como em qualquer situação de dor.

Leia a entrevista na integra:

Jorge Araújo: eu peguei a Covid e nunca senti tantas dores na minha vida. Depois que a Covid vai embora, ficam as sequelas, principalmente dores no corpo. É o momento do cidadão que passou a situação que eu passei procurar um especialista pra fazer uma fisioterapia?
Dr. Luís Felipe Daneu: sim! O que a gente tem costumado ouvir falar da Covid é que é uma tempestade inflamatória. Se fala muito da parte pulmonar, mas tem todos os outros sistemas que são acometidos, a parte vascular, articular, tudo tem resposta inflamatória. Então é bastante comum não ter sintomatologia grave durante a Covid e depois a pessoa apresentar dores, uma sensação de cansaço, indisposição por conta da agressão desse vírus. O que a gente recomenda é que após a pessoa ter sido positivada à Covid de forma nenhuma inicie uma atividade física sem antes fazer uma avaliação ortopédica e cardiológica, porque as vezes pode ter uma sequela e com o início da atividade física, principalmente uma mais intensa, você desenvolver um quadro mais grave.

Jorge Araújo: é bom citar também que algumas pessoas estão conseguindo trabalhar, outras não, mas você leva em consideração que as pessoas estão em casa. As vezes passam o maior tempo deitada, as vezes passam bom tempo também sentadas e as dores só chegam a todo o momento. 
Dr. Luís Felipe Daneu: na verdade, antes da Covid já existia uma pandemia que é a pandemia do sedentarismo e da obesidade. É um problema mundial que precisava ser abordado de uma forma mais direta. A tecnologia e os hábitos de vida estão fazendo com que a pessoa seja mais sedentária, por exemplo, antigamente o vidro do carro era levantado na manivela, hoje tem vidro elétrico, as televisões tem controle [remoto], o indivíduo fica no sofá e não levanta mais pra nada. Esses hábitos de vida, o sedentarismo, é um mal que a gente tá fazendo pro nosso próprio corpo. A parte muscular precisa de movimento, então tudo o que a gente deixa de usar a gente perde músculo, atrofia. Quanto a articulação, uma forma de fazer com que ela tenha lubrificação, tenha movimento, é estar sendo ativo durante o dia a dia. A gente tem atendido muitos pacientes no consultório que, por conta da pandemia, deixaram de trabalhar, muitos deixaram de fazer atividade física, estão só dentro de casa comendo, a cabeça não fica legal por conta de ver tanta tragédia e tudo isso junto termina fazendo com que aumente as dores. Como médico, a gente tem que pesar se orienta que inicie uma caminhada para aquelas pessoas que têm uma área ao ar livre próxima, mesmo com todos os cuidados ou se realmente pede que fique em casa pra se precaver dessa doença maior que estamos passando.

Jorge Araújo: outro problema a ser levado em consideração é a automedicação. Os cidadãos sentem dores e ficam “isso vai passar”, mas pode se agravar e a pessoa pega qualquer tipo de medicamento que um amigo [indica] e toma, poque hoje o amigo é mais inteligente que o especialista.
Dr. Luís Felipe Daneu: e hoje a tecnologia trouxe o doutor Google. Você coloca uma doença na internet e já vem lá as vezes até a receita, você pega dicas de medicação. É bastante comum essa automedicação, as vezes o paciente tem uma medicação que foi passada há um ano por um problema, sobrou e ele toma de novo. Anti-inflamatórios e analgésicos de uma forma geral podem acarretar problemas renais, de estômago... podem até mascarar um problema maior, porque vai diminuir um pouquinho a dor, o processo inflamatório, a pessoa vai achar que tá resolvendo, mas o problema pode se agravar.

Jorge Araújo: agora com relação a quem pratica esportes, essa questão do crossfit, o senhor recomenda?
Dr. Luís Felipe Daneu: eu gosto de falar sobre o crossfit pois existe um mito de que o crossfit lesiona muito. O que os trabalhos no mundo inteiro mostram é que o crossfit lesiona menos do que, por exemplo, uma atividade de academia e algumas atividades esportivas. Qual é o problema de toda modalidade nova? Começa a proliferar boxes de academias com possíveis instrutores sem ter a formação adequada e os alunos não fazem o acompanhamento adequado. Existe uma outra coisa que é particular do homem: a competição. Tá num box de crossfit e não quer passar vergonha, que chegar junto [do outro aluno] mesmo não tendo condições. O que os trabalhos mostram é que as mulheres são ais comedidas, respeitam mais as orientações, o nível de atividade que ela tem. Cada atleta tem uma condição física, então não pode querer se igualar. Crossfit bem orientado e com um instrutor preparado tem um risco de lesão bem menor do que uma atividade na academia ou uma atividade de luta.

Jorge Araújo: quando a pessoa vai fazer uma atividade física, seja ela qual for, tem de procurar um especialista.
Dr. Luís Felipe Daneu: isso, as vezes a pessoa pega qualquer tênis que tem em casa, bota até uma sandália, nunca caminhou e resolve caminhar dez quilômetros, subir e descer ladeira. Aí é um desastre porque no outro dia não consegue levantar e coloca a culpa unicamente no exercício. Começou errado: não fez avaliação médica, não colocou o calçado adequado, não o programou o tempo nem a distância pra fazer a caminhada... tudo deve começar devagar e paulatinamente ir evoluindo.

Jorge Araújo: com relação a essa questão da tendinite, o que é? As vezes as pessoas falam que tem, mas sem saber de fato se está. 
Dr. Luís Felipe Daneu: a tendinite ou tenossinovite são inflamações nos tendões. A gente deve imaginar que o tendão é o cabo que liga o músculo ao osso e é responsável pelos movimentos. Muitas vezes as pessoas falam “eu tenho tendinite”, isso é uma consequência de um outro problema que ela tem a atualmente a maioria desses processos inflamatórios estão relacionados a atividades repetitivas, não só aquela pessoa que trabalha escrevendo ou digitando, mas à tecnologia. Hoje você entra na recepção de um hospital, por exemplo, todas as pessoas estão de cabaça baixa olhando seus celulares e teclando, se deixar ficar duas, três horas. Hoje o maior número de paciente que a gente atende no consultório com as inflamações tendíneas estão relacionadas ao que a gente chama de ergonomia, a postura ruim, e a atividade de repetição principalmente relacionada à tecnologia.

Jorge Araújo: quando a pessoa acorda, se espreguiçar ou fazer qualquer tipo de movimento, realmente funcionar pra se ter um dia mais saudável?
Dr. Luís Felipe Daneu: sim, funciona! Claro que precisa ser feito de uma forma regular e com uma boa ergonomia. O correto é que, antes de se levantar, a gente pudesse fazer alguns alongamentos porque a estrutura estava toda em repouso, toda encurtada, e o que o alongamento faz é preparar nossa estrutura corporal para executar o movimento. É benéfico desde que feito de forma correta.

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